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Um modelo de liderança

Em seu livro The Making of a Leader (A formação de um líder), Chua Wee Hian narra a seguinte experiência:

Em 1981, eu estava no Brasil, realizando uma série de seminários sobre liderança espiritual. Os participantes eram, em sua maioria, estudantes que ocupavam posições de liderança em sua igreja. Na primeira reunião, pedi-lhes que desenhassem um logotipo ou emblema para designar liderança. Eles apresentaram vários símbolos usando imagens como coroas, cetros, escudos, espadas, cabeça de leão e pergaminhos. Todos os desenhos tinham a ver com a pessoa de um rei. Fiquei impressionado com o sentido de autoridade evidente nas ilustrações deles. O desenho vencedor, sem dúvida alguma, ficaria muito bem numa camiseta. E muitos iriam querer adquiri-la.

Mas os estudantes não haviam consultado um dicionário de sinônimos, como eu consultara. (…) Procurei a palavra “líder”. E a lista era de impressionar: general, comandante, diretor, gerente, cabeça, oficial, capitão, senhor, chefe, governador, dirigente, executivo, patrão e crânio. Isso harmonizava-se perfeitamente com os logotipos produzidos pelos alunos.

Em seguida, examinamos os textos de Lc 22.24-27 e Jo 13.3-5 e 12-17. Após o estudo dessas passagens, os alunos tiveram de refazer seus logotipos. As novas versões traziam desenhos de toalhas, bacias ou figuras ajoelhadas servindo. Mas agora tínhamos um problema. Suponhamos que aqueles emblemas que falavam de serviço e humildade fossem impressos em camisetas. Quantas pessoas comprariam e usariam uma delas. Você usaria?”.33

Pedro exorta: pastoreai (pastoreai vós: plural!) o rebanho de Deus… não como dominadores dos que vos foram confiados, antes, tornando-vos (plural) modelos do rebanho (1Pe 5.1). Vejo aqui que não há como compararmos o modelo de liderança encontrado em qualquer outra instituição (a hierarquia militar, por exemplo) com a igreja de Deus. Os presbíteros devem se abster de procurar serem obedecidos porque são “os chefes”. Eles são investidos de autoridade? Sim. Mas uma autoridade de natureza diferente da do mundo, uma autoridade que deve ser obedecida por se tornar modelo. “Mas Jesus lhes disse: os reis dos povos dominam sobre eles, e os que exercem autoridade são chamados benfeitores. Não é assim entre vós”. (Mt 20, Mc 10, Lc 22). Como aplicar esses princípios dentro de um sistema colegiado de governo? Alguém se destacará por uma pregação eloquente, outro pela sabedoria e conhecimento bíblico-teológico, outro por sua capacidade administrativa; uns serão mais comunicativos, outros mais reflexivos. Mas todos deverão se submeter individualmente ao grupo. Se cada presbítero, individualmente, não é capaz de ser liderado, como será capaz de liderar adequadamente?

Nesse ponto, podemos concluir que o desejo de primazia não é cristão. Paulo afirma que desejar o episcopado é algo bom (1Tm 3.1). Mas este é um episcopado cristão onde o indivíduo sobressai por servir (Mt 20.26), permanecendo sempre submisso a outros. O presbítero João, escrevendo a Gaio (3 Jo 9), informa-nos acerca de um tal de Diótrefes, (“que gosta de exercer a primazia entre eles”) que não lhe dava acolhida, proferia palavras maliciosas contra ele e expulsava da igreja os irmãos que desejavam acolher os seus mensageiros. Após esse relato, conclui: não imites o que é mau (v.11). Parece haver dois procedimentos errados relatados nesta passagem: O primeiro é o desejo de primazia exercido por Diótrefes; o segundo é a passividade dos demais, que não exerceram sua autoridade para inibir com firmeza a este que acabou por deixar de ser presbítero para se transformar num tirano.

Esta passividade tem sido estimulada por muitos pastores, principalmente aqueles que gostam de “exercer autoridade e dominar” (veja Mt 20.25-26). Usando indevidamente a figura bíblica da “ovelha” e do “rebanho”, estimulam nos membros de suas congregações as características negativas deste animal. Afirmam que ovelha é mansa, não berra; o pastor sabe quais são os lobos disfarçados de ovelhas dando com o cajado na cabeça de todos – a ovelha não reagirá. Quem reage é lobo. Dessa forma, afastam aqueles que poderiam contestar sua “autoridade” e seus erros. Já ouvi de um antigo pastor, zeloso de sua autoridade, a afirmação de que “ovelha é burra”. Ele se referia aos membros da igreja! De fato a ovelha (o animal) é burra, enxerga pouco, não sabe se defender, erra frequentemente o caminho… serão por essas características que o verdadeiro líder cristão gostaria que sua congregação fosse conhecida? Efésios 4.11-16 mostra que a liderança da igreja foi constituída por Deus, com a finalidade de conduzir os eleitos ao pleno conhecimento do Filho de Deus, à perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo. Aí não há nada da ingenuidade, da burrice e da passividade característicos do animal.

Em última análise, a finalidade da liderança cristã é tornar-se desnecessária, pois quando todos chegarem à perfeita varonilidade e à medida da estatura da plenitude de Cristo, não precisarão de ninguém para guiá-los. Evidentemente isso só acontecerá (inclusive com os líderes) na glória. Mas este é o alvo: sermos como Cristo (veja também Rm 8.29; 2Co 3.18). Que glória para uma congregação ouvir o que Paulo disse aos Romanos: E certo estou, meus irmãos, sim, eu mesmo, a vosso respeito, de que estais possuídos de bondade, cheios de todo o conhecimento, aptos para vos admoestardes uns aos outros (15.14). Se uma igreja permanece por anos com membros, portando-se como meninos sem crescimento (Ef 4.14-15), algo está errado.

As qualificações dos presbíteros

“Os judeus, portanto, eram e são presbiterianos na sua forma de governo eclesiástico”.34 Esta afirmação de F. Martins demonstra o reconhecimento de que muitos aspectos de nossa cultura cristã – por exemplo, a forma de governo plural –, são erigidos a partir de uma base judaica. Partindo desse pressuposto, devemos perguntar: como um judeu chegava ao ofício de ancião?

Embora longa, a citação abaixo merece consideração:

Certa vez, Ignaz Maibum, um rabino reformista de Londres, envolveu-se numa polêmica com alguns de seus colegas, rabinos ortodoxos, pelas colunas de um semanário judaico. Em dado momento, um de seus adversários ortodoxos comentou, numa carta, que os rabinos reformistas eram meros ‘párocos judeus’, expressão que visava claramente veicular a ideia de que tinham renunciado à autêntica tradição judaica para imitar os modos dos clérigos cristãos. Maibaum retrucou que, se os rabinos reformistas eram ‘párocos judeus’, os ortodoxos poderiam igualmente ser qualificados de ulemás judeus.

A significação dessa resposta é bem clara. Existem, de fato, certas semelhanças entre a posição do ulemá na vida islâmica e a do rabinato nas comunidades judaicas ortodoxas. Nem o alim (singular de ulemá), nem o rabino são ordenados; nenhum dos dois exerce uma função sacerdotal. Nem o judaísmo nem o islamismo possuem sacramentos, altares, ordenação ou mediação sacerdotal. Não há função religiosa que um crente comum, adulto, do sexo masculino, provido dos necessários conhecimentos, não possa executar tão bem quanto o alim ou o rabino. Ambos são profissionais da religião, mas nenhum se enquadra, de forma alguma, no papel do sacerdote. Adquirem o seu status através do saber, do estudo e do reconhecimento, que se torna uma espécie de certificado (…). Em todos esses aspectos, assim como em alguns outros, há notáveis semelhanças entre a formação, a qualificação e a função do rabino ortodoxo e a do alim muçulmano sunita. (A condição do mullah xiita é um pouco diferente.) Essa identidade tão surpreendente, que se torna ainda mais visível quando se verificam as diferenças entre seu status comum e o dos cleros do cristianismo e de algumas outras religiões, obviamente requer que se estabeleçam certas conexões históricas.35

Adiante, o autor indica a influência judaica sobre a formação e a condição do alim na comunidade muçulmana. Será que nesse aspecto não poderíamos prestar mais atenção às nossas raízes judaicas? A imposição de mãos do presbitério se daria, então, sobre aquele homem experimentado (“ancião”), reconhecido pela comunidade pela manifestação de uma vida familiar estável, temperamento moderado, sabedoria e conhecimento das Escrituras e capacidade para ensiná-las. Atualmente, dá-se mais atenção à formação acadêmica (nem sempre bem feita) do que à experiência. Um jovem de 20 e poucos anos, recém-saído de um seminário, não terá necessariamente essas qualidades. Nesse ponto percebe-se que a igreja, institucionalizando-se, passou a adotar procedimento semelhante ao usado por empresas seculares para admitir seus profissionais: a exigência de uma formação acadêmica com uma diferença crucial: os jovens que saem das universidades não iniciam seu primeiro emprego em cargos de liderança. As empresas normalmente têm um plano de carreira no qual os cargos executivos são reservados aos que tem experiência (e essa é uma palavra-chave). Como vimos, a palavra presbítero (ancião) implica em maturidade, experiência.

Os textos de 1Tm 3.1-7 e Tt 1:5-9 demonstram que a igreja deve eleger homens que se destaquem em uma comunidade de homens e mulheres que também possuam essas mesmas qualidades. Submetendo-nos a estes textos, será inevitável a aplicação de muito mais rigor e critério na escolha dos nossos líderes. O próprio homem que “almeja tão excelente obra” deverá prestar especial atenção à sua própria vida, à sua bagagem bíblico-doutrinária (conhecimento) e à aplicação dela às situações cotidianas (sabedoria). Para aqueles que se destacam na pregação e ensino, e que desejam dedicar-se em tempo integral ao ministério, é desejável (mas não indispensável) a formação acadêmica. Mas estes não deveriam ter nenhuma função privativa, tal como administrar os sacramentos ou invocar a chamada benção apostólica,36 tampouco nenhuma prerrogativa (por exemplo, de poder exercer sozinho as funções do colegiado, de não ter suas faltas julgadas pelos demais presbíteros).

Uma igreja concebida nestes moldes teria uma liderança não profissional, com homens mais ligados à própria comunidade, sem distinção entre “clérigos” e leigos e mais próxima do espírito reformado do sacerdócio universal de todos os crentes.

Igreja Presbiteriana ou Congregacional?

Na prática, um governo presbiteriano pode ter várias nuances, variando de um presbitério fechado, oligárquico, com os líderes reunindo-se secretamente (Mt 20.25) até um aberto, exposto à congregação (At 15.6-7,17,22). O N.T., apesar de mostrar que os presbíteros eram eleitos pelas comunidades locais (At 14.23), silencia quanto à duração de um possível mandato, se havia confirmação periódica da comunidade quanto à permanência dos presbíteros e também quanto aos mecanismos pelos quais a igreja participava das decisões e em que nível ou grau de intensidade isso acontecia; parece que, para a exclusão de membros, a decisão final caberia à congregação e não somente aos líderes (Mt 18.17; 1Co 5.1-13). O fato incontestável é que a igreja tem líderes e deve obediência a eles, mas esta é uma submissão semelhante a da mulher ao marido (Hb 13.17), pois não existem mecanismos de coerção legítimos que possam ser usados pelos líderes (1Pe 5.2-3). Não há nenhuma prescrição aos maridos ou aos líderes da igreja do tipo “reduzam vossas esposas (ou vossas congregações) à submissão”. A ordem é para as esposas e congregações: sejam submissas aos vossos maridos, obedecei aos vossos guias. Deve haver a disposição voluntária de obedecer, de outra forma o que acontecerá? Restará tanto ao marido quanto ao guia “gemer” (cf. Pv 21.9,19; 25.24; 27.15 com Hb 13.17). Em resumo, a igreja local descrita pelo N.T. parecia ter um governo presbiteriano com uma pitada congregacional.

Quanto ao relacionamento entre as igrejas locais, a Declaração de Savoy sobre fé e ordem de 1658 diz:

XXVI. Em casos de dificuldades ou divergências, seja em pontos de doutrina ou de administração, está de acordo com a mente de Cristo que muitas igrejas que mantém comunhão entre si, por seus mensageiros, se reúnam em sínodo ou concílio, a fim de considerarem e darem seu conselho. Contudo, tais sínodos não possuem qualquer poder eclesiástico nem qualquer jurisdição sobre as igrejas como tais.

XXVII. Além dos sínodos ou concílios ocasionais, não foram instituídos por Cristo quaisquer sínodos fixos numa determinada combinação de igrejas ou de seus oficiais, em assembleias maiores ou menores.

Os batistas e congregacionais parecem ter razão quando afirmam que (excetuado o período apostólico) não há autoridade fora da igreja local, tais como os presbitérios ou sínodos permanentes da Igreja Presbiteriana. Em resumo, a igreja é essencialmente presbiteriana “para dentro”, no seu governo local, e congregacional “para fora”, no seu relacionamento com outras igrejas locais.

O Evangelho versus grandes personalidades

Em um intervalo de poucos anos assistimos, perplexos, a queda de homens que ocupavam posição de proeminência na Igreja. O presidente do supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil, o ex-presidente da Visão Mundial e presidente da Convenção Batista Brasileira e, por fim, o presidente da Vinde – Visão Nacional de Evangelização e presidente de honra da Associação Evangélica Brasileira, os dois últimos autores de vários livros.

Teria a forma de governo vigente em nossas igrejas alguma influência na queda destes homens? Mesmo não sendo uma influência decisiva, penso que sim.

O que aconteceu com esses pastores demonstra que a natureza humana, mesmo nos nossos melhores representantes, pode ser perigosamente suscetível às influências da fama, da honraria exagerada e da admiração dos homens. Por isso, cada vez que um mero homem – por melhor que seja – é colocado sozinho em posição de proeminência, surgem ocasiões de tentação.37

Já se falou e escreveu muito sobre como o pastor pode ser solitário. E por quê? Primeiro, porque o sistema é falho, humano e não divino. Não era para ser assim. Segundo, essa notória “solidão do ofício” parece ser um subproduto de duas inclinações humanas, a de ser idolatrado e a de idolatrar. De fato, os homens parecem necessitar da figura de um homem forte a quem devotam lealdade, por quem lutam ou a quem imitam. Os artistas têm os seus inevitáveis fã-clubes; e, mesmo em nosso meio, não deixam de existir as multidões de seguidores de cantores e dos grandes pregadores. Por outro lado, essas pessoas que ficam em evidência, mesmo com as melhores intenções, no decorrer de suas carreiras, parecem enredar-se nas sutis armadilhas que os holofotes trazem. Se no início se sentem desconfortáveis, depois se acostumam e, mais adiante, passam a gostar dos paparicos, dos autógrafos, das atenções especiais, do tratamento diferente, da devoção exagerada.

Há igrejas em que somente após o povo estar acomodado é que o pastor ou pastores entram em processional pelo templo. Em algumas, o povo se levanta para acompanhar e às vezes até aplaudir o “homem de Deus” que está entrando.

Essas tendências não são novas. Podemos encontrá-las, por exemplo, na crítica que Charles Spurgeon escreve (citando outro autor de um século antes) a respeito das distinções artificiais existentes em seu tempo entre o “clérigo” e o povo:

É igualmente deplorável que não possamos induzir os pregadores a falarem e gesticularem como outras pessoas sensatas, pois lhes será impossível cativar as massas enquanto não o fizerem. Todas as estranhas questões de atitude, entonação e vestuário, são barricadas entre nós e o povo. Temos que falar como homens, se queremos ganhar homens (…) Há cem anos, o vestuário dos clérigos era quase tão distinto como agora, mas não tinha sentido doutrinário, e não passava de vaidade no vestir, se se deve crer em Lloyd, quanto ao que se diz em sua “Súplica Métrica em Favor dos Eclesiásticos”. Ele ataca os párocos com muita franqueza e, dentre os restantes, descreve um janota canônico:

 

Veja o Nugavã, seus enredos e meneios,

um fantoche de igreja, nada mais que autômato ordenado.

Olhe o seu andar miúdo e tênue.

A religião é creme e capa no seu rosto!

É toda religião, desde a cabeça aos pés!

Os chapeleiros e os barbeiros fazem isto.

Emprega a religião imitando o modista;

É ortodoxa somente em coisas exteriores:

Faixas, luvas, anéis, chapéus, batinas, túnicas.

Sinal do seu saber é a touca de doutor,

e prova a sua bondade porque a roupa é boa.

 

Este apego às vestes garbosas levou a uma empertigada nobreza no púlpito. Chamavam-lhe “dignidade”, e se orgulhavam dela. Distinção e decoro eram sua principal preocupação, e estas se mesclavam com pompa ou com ostentação tola e risonha, conforme as peculiaridades de cada criatura, até que os sinceros se cansaram das suas representações ocas e partiram para longe daquelas ministrações bombásticas. Mas os ministros não se importavam, pois se as pessoas de bom gosto ficavam satisfeitas, eles tinham toda a recompensa que desejavam, e enquanto isso as multidões pereciam por falta de conhecimento.38

Conta-se que um grupo de americanos que estava em Londres, no século passado, foi ouvir um famoso pregador contemporâneo de Spurgeon. Ao saírem da reunião, comentaram: “Que grande pregador é o Dr. Fulano!” Posteriormente, assistiram a uma pregação de Spurgeon e saíram dizendo: “Que grande salvador é o Senhor Jesus!” É a Cristo, unicamente, que a igreja deve exaltar. Lamentavelmente, a igreja tem se apoiado em lideranças personalistas, mesmo que de natureza benéfica. Homens têm sido colocados em evidência junto com Cristo e a mensagem do Evangelho; e quando esses homens caem, a credibilidade da mensagem cai junto. A prática tem demonstrado que é preciso despersonalizar a igreja. O Evangelho não necessita da autoridade de homens para se firmar. Ele tem autoridade por si. A solução – ou uma delas – está na forma de governo prevista no N.T. Um governo que não ponha em destaque o indivíduo: o governo presbiteriano, plural, conciliar.

 

NOTAS:

  1. Citado de Jesus, o Rei Servo, de Alec D. Brooks, artigo publicado na Revista Mensagem da Cruz, janmar 1995, nº 104, p.10-11.
  2. F. Martins, p. 46.
  3. Bernard Lewis, Judeus do Islã, Ed. Xenon, Rio, 1990. p 77-78 (sublinhados acrescentados). O NT indica que o judeu tinha mais acesso à leitura e explicação pública das Escrituras nas sinagogas do que o cristão atualmente nas igrejas (confronte Mt 4.23; 9.35; 13.54; Mc 1.21,39; 6.2; Lc 4.15-16,44; 6.6; 13.10; Jo 6.59;18.20; At 9.20; 13.5,14-15; 14.1; 15.21;17.1-2,10-11,17;18.4,19,26;19.8; At 28.17-23 com o Catecismo Maior, pergunta 156: “A palavra de Deus deve ser lida por todos? R. Embora não seja permitido a todos lerem a Palavra publicamente à congregação, contudo os homens de todas as condições têm obrigação de lê-las em particular para si mesmos e com suas famílias…”). Uma leitura cuidadosa destes textos mostra a importância da sinagoga – e da liberdade com que se podia falar dentro delas – na pregação do evangelho e na difusão do Cristianismo. Vemos a mensagem cristã sendo levada às sinagogas espalhadas pelo império romano, como Damasco, Salamina, Antioquia da Psídia, Icônio, Tessalônica, Beréia, Atenas, Corinto e Éfeso por homens como Paulo, Barnabé, Silas e Apolo, como fazia Jesus nas sinagogas da Judéia (Lc 4.44) e Galiléia (Mt 9.23).
  4. Se o “pastor” não é um sacerdote, porque sem ele não pode haver batismo e celebração da ceia? Por que somente o pastor pode impetrar a chamada “bênção apostólica” que é simplesmente o fecho da 2ª carta aos Coríntios? Parece que a “bênção apostólica” se tornou um 3º sacramento criado com a finalidade de marcar a distância entre o reverendo e os “leigos” (aliás, se a bênção é “apostólica”, homem nenhum tem o direito de pronunciá-la atualmente). Lutero considerava que todo cristão é um ministro e que a cerimônia de ordenação era “meramente a forma pública pela qual alguém é comissionado mediante a oração, as Escrituras e a imposição de mãos, a fim de servir à congregação.” As funções sacerdotais são privilégio de todos os crentes e “não a prerrogativa de uma casta seleta de homens santos”. “Lutero enumerou sete direitos que pertencem a toda a igreja: pregar a Palavra de Deus, batizar, celebrar a Santa Comunhão, carregar “as chaves”, orar pelos outros, fazer sacrifícios, julgar a doutrina”. (cf. GEORGE, Timothy, Teologia dos Reformadores. Ed. Vida Nova, São Paulo, 1994, p.96-98). Evidentemente, o controle destas atribuições deve pertencer à liderança da igreja. At 15.24 é sugestivo: Porquanto ouvimos que alguns que saíram dentre nós vos perturbaram com palavras, e transtornaram as vossas almas, dizendo que deveis circuncidar-vos e guardar a lei, não lhes tendo nós dado mandamento (ARC). O texto da ARA diz: sem nenhuma autorização. Portanto, não vejo “desordem” se, p. ex., os presbíteros da igreja autorizassem um membro a batizar uma pessoa que ele próprio evangelizou. De fato, vemos na Bíblia um diácono batizando (At 8.12, 36-38: O eunuco pergunta a Felipe: que impede que seja eu batizado? Se vivesse hoje, Felipe responderia: não posso batizar-te, somente um ministro ordenado pode.), um “mero” discípulo, sem nenhum cargo conhecido batiza aquele que viria a ser o apóstolo Paulo (At 9.10-18) e “alguns irmãos” (Pedro informa que eram seis – At.11.12) batizam Cornélio e sua família por ordem de Pedro (At 10.23,48). Isso pressupõe uma membresia responsável, autodisciplinada, educada e com boa formação bíblica. Utopia? As utopias são bons alvos. Se não os alcançamos, pelo menos que cheguemos o mais próximo que pudermos.
  5. Até mesmo nos grandes reformadores, Lutero e Calvino, podemos encontrar essas tendências. Lutero, embora tenha renunciado aos seus votos monásticos, “apegou-se tenazmente a seu professorado e a seu grau de doutor”, obtido na Igreja Católica Romana. (George, p. 57). “Nos primeiros anos da Reforma, Andreas Bodenstein von Karlstadt, (…) que havia presidido a cerimônia de outorga do doutorado de Lutero, em 1512, renunciou seus próprios graus de doutor (ele possuía três!) e juntou-se aos camponeses de Orlamunde como seu pastor-fazendeiro. Lutero censurou o novo estilo de vida de Karlstadt em seu tratado Contra os Profetas Celestiais: ‘O que você acha agora? Não é uma bela nova humildade espiritual? Usar um chapéu de feltro e trajes cinzentos, não querer ser chamado de doutor, mas sim, de irmão Andrew e caro vizinho, como qualquer outro camponês […] como se o comportamento cristão consistisse em tais dissimulações externas’”. (George, p. 58). “Embora Calvino certa vez tenha descrito a si mesmo como ‘meramente um homem dentre o povo’, movia-se com facilidade entre os altos escalões da sociedade. Era um aristocrata de coração, se não de linhagem. Ele nunca esqueceu tal fato acerca de si mesmo, nem deixava que os outros se esquecessem disso. Certa vez, nas ruas de Genebra, um refugiado agradecido, mas por demais entusiasmado, chamou-o de ‘irmão Calvino’, apenas para ser informado de que o título correto era ‘Monsieur Calvino’” (George, p. 168).
  6. SPURGEON, C.H. Lições aos Meus Alunos, vol 1, p. 147-148. PES. (Sublinhados acrescentados). Spurgeon estava seguindo a boa tradição puritana que estreitou radicalmente a distância entre clero e laicato, rejeitando consequentemente as vestes clericais. “Um puritano, o botânico William Turner, de Wells, até treinou um cão de estimação para pular e abocanhar os bonés quadrados das cabeças dos clérigos!” (Leiland Ryken, Santos no Mundo, os puritanos como realmente eram. Ed. Fiel. 1 ed. 1992, p. 132).

Autor: Túlio Cesar Costa Leite

Fonte: Monergismo

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